Dia Mundial de Luta Contra a AIDS: de doença mortal a condição tratável
O 1º de dezembro marca o Dia Mundial de Luta Contra a AIDS, que relembra como a resposta da medicina à AIDS, desde identificação da doença, trouxe progressos fundamentais: hoje, é possível controlar a doença, melhorar a qualidade de vida e permitir longevidade para pessoas que vivem com o vírus HIV. Com esses avanços, os soropositivos têm acesso à medicação eficaz, segura e, a exemplo do Brasil, gratuita.
Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/ AIDS (UNIAIDS), desde 2010, as novas infecções por HIV diminuíram 40% no mundo, de 2,2 milhões para 1,3 milhão, em 2024. Porém, esta redução está aquém da meta de ficar abaixo das 370 mil, até 2025. Em 2023, cerca de 39,9 milhões de pessoas viviam com HIV em todo o mundo, foram registradas cerca de 1,3 milhão novas infecções e 630 mil mortes relacionadas à AIDS.
Desde os anos 1980, quando a doença foi descoberta, o Brasil soma mais de 1,16 milhão de casos – uma média anual de 36 mil nos últimos cinco anos – e 392 mil óbitos, segundo a UNIAIDS Brasil. Nos últimos dez anos, houve queda de 32,9% na mortalidade: de 5,7 em 2013 para 3,9 óbitos por 100 mil habitantes, em 2023. Nesse mesmo ano, a taxa de detecção de AIDS foi de 17,8 casos por 100 mil habitantes, o número de óbitos relacionados a AIDS foi de 10.338 e as relações sexuais sem proteção continuam sendo a principal via de transmissão (75,3%).
Esse cenário comprova a efetividade de políticas públicas integradas, que aliam a promoção de direitos básicos e cidadania a iniciativas voltadas para a prevenção, diagnóstico precoce, tratamentos e redução das desigualdades sociais, além de ações educativas e informativas. Porém, em seu surgimento, nos anos 1980, os pacientes enfrentaram dificuldades nos tratamentos, já que a doença era totalmente desconhecida pela ciência e, também, em função dos estigmas, que associaram o HIV a grupos específicos de pessoas que apresentavam “comportamentos de risco”: homens homoafetivos que não usavam preservativos nas relações sexuais, usuários de drogas injetáveis e hemofílicos, cujos tratamentos incluem transfusões de sangue. Além disso, a percepção social era muito moralista e intensa, agravando a desinformação e a exclusão no combate da doença.
“Nos primeiros anos, não havia tratamentos que realmente pudessem devolver a ‘vida normal’ aos pacientes soropositivos. Hoje, temos um arsenal terapêutico que permite reduzir a quantidade de vírus no sangue, alcançando um quadro que chamamos de carga viral indetectável. Na prática, isso significa que, por meio de uma combinação de medicamentos antirretrovirais – que tratam as infecções causadas pelo vírus da imunodeficiência (HIV) – estamos fortalecendo o sistema imunológico das pessoas infectadas e devolvendo sua função de defesa dos organismos. São avanços da medicina que também vêm contribuindo para aumentar o controle da transmissão do vírus na população”, diz Dra. Cláudia Murta, infectologista do Hospital Felício Rocho.
Ela detalha que as estratégias de tratamento geralmente começam com três tipos de fármacos. Após o restabelecimento do sistema imunológico e a queda da carga viral no sangue do paciente, essa medicação pode ser reduzida para dois ou até para um único comprimido, conforme a resposta à terapia. “Atualmente, contamos com mais possibilidades de tratamentos guiados para diferentes casos, como terapêuticas mais apropriadas para gestantes, por exemplo, ou que causam poucos efeitos colaterais e que são bem toleradas por diferentes perfis de pacientes. Isso melhora a adesão e a manutenção da carga viral indetectável nos soropositivos, aspecto fundamental ao controle da doença”, destaca a especialista.
De “grupos de risco” a “comportamentos de risco”
Com o avanço e o empenho da ciência, a ideia de que a doença se propagava apenas em alguns perfis de grupos sociais foi ficando para trás. Após diversas pesquisas, tornou-se evidente que a transmissão do HIV dependia de comportamentos de risco, como sexo sem proteção ou compartilhamento de agulhas, e de fatores estruturais e socioeconômicos que aumentam a vulnerabilidade.
Em 1996, a introdução da Terapia Antirretroviral (TARV) transformou a AIDS de doença fatal para condição crônica gerenciável. A TARV representou um grande avanço da medicina no combate da AIDS, diminuindo as taxas de morte pela doença, possibilitando aos pacientes mais qualidade de vida e, principalmente, devolvendo a essas pessoas a chance de viver, mesmo após a contaminação.
Hoje, o HIV já não é mais vinculado a grupos, a taxa de pessoas heterossexuais infectadas tem crescido em decorrência do sexo sem proteção, inclusive em mulheres, e observa-se maior concentração de novos casos entre jovens de 20 a 34 anos. O perfil de pessoas contaminadas mudou completamente e o foco de atenção é a proteção contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e o uso de agulhas. “Todo sangue doado no Brasil passa por vários exames até ser considerado saudável para transfusão. Já os medicamentos estão amplamente disponíveis no SUS e os brasileiros soropositivos obtém gratuitamente o esquema antirretroviral”, pontua Dra. Cláudia.
Envelhecimento da população soropositva
Com a grande melhoria dos tratamentos das infecções pelo HIV, a expectativa de vida dessas pessoas melhorou muito, podendo chegar ao mesmo patamar de pessoas sem o vírus. “Isso traz mais desafios no manejo dos soropositivos, porque além da medicação antirretroviral, é necessário utilizar remédios para o controle de hipertensão arterial, diabetes, colesterol etc. Para esse público, a atenção do médico se volta para as interações entre esses remédios, os efeitos colaterais e as adequações terapêuticas que vão manter a saúde desse público que está envelhecendo”, afirma Dra. Cláudia. Ela enfatiza que além dos medicamentos, é importante que pessoas que vivem com o vírus tenham hábitos de vida saudáveis. “Esse conjunto de cuidados permitem quantidade de vida com qualidade”, conclui.


